Brasil. Silvio Santos, o lambe-botas
O jornalista Ricardo Miranda afirma que não é à toa que o slogan da ditadura «Brasil, ame-o ou deixe-o» tenha sido resgatado por um tradicional lambe-botas como Silvio Santos. Ele diz: «isso me marcou muito nos meus primeiros anos de vida. Lembro como se fosse hoje de adesivos nos vidros de carros – geralmente fuscas, Aero Willys e Gordinis, com esse convite no melhor estilo ‘Cai fora, esquerdista/comunista’.»
Editor do blog Gilberto Pão Doce,
Miranda relembra os tempos sombrios da ditadura:
«O ano era 1969. Eu, nascido depois do golpe, tinha três anos.
A ditadura militar vivia um de seus movimentos serpentinos, sibilando rumo aos anos de chumbo da ditadura. O Alto Comando das Forças Armadas, que faziam as vezes de urnas na época, escolheu para seguir a linhagem o general ultradireitista Emílio Garrastazu Médici – outro dos ídolos de Jair Bolsonaro, junto com o torturador Brilhante Ustra.
O ministro do Exército, Orlando Geisel, ficou encarregado de doutrinar a área militar. Delfim Netto cuidava de maquiar o «milagre econômico» para os mesmos, como o capitão quer fazer agora com os números do desemprego.
Na Casa Civil, o professor de direito Leitão de Abreu era o Onyx Lorenzoni da ocasião, só que sem o implante e sem o diploma de veterinário – muito apropriado para pajear o «Cavalão», um dos apelidos mimosos de Bolsonaro.
Os guerrilheiros Carlos Marighella e Carlos Lamarca haviam sido assassinados no regime. Os direitos fundamentais do cidadão foram reduzidos a pó e as prisões facilitadas – tal qual planeja agora o juiz-político Sérgio Moro (aliás, que horário eleitoral gratuito magnífico ganhou no Jornal Nacional de terça, mais de 15 minutos e um bloco inteiro). Nas escolas, nas fábricas, na imprensa, nos teatros, a sociedade brasileira sentia a mão de ferro da ditadura.
O governo gastava milhões de «cruzeiros» em propagandas ufanistas para entorpecer sua imagem junto ao povo».
E relata a percepção sobre o apresentador Silvio Santos:
«Silvio Santos, mais conhecido da maioria dos espectadores brasileiros como o ex-camelô que virou um grande milionário, morando atualmente em Orlando, na Flórida, o comunicador criador do Baú da Felicidade, do Show de Calouros, do Roletrando, do «Topa Tudo por Dinheiro», o patrão do Lombardi – sua viúva perdeu ação trabalhista contra Silvio Santos, mesmo com mais de 30 anos de serviços prestados pelo marido -, do Jassa, do Pablo («Qual é a Música?»), o importador de novelas mexicanas, o sovina que luta contra o dramaturgo José Celso Martinez Corrêa para tirar o Teatro Oficina do Bixiga -, é, por trás dos dentes postiços, da peruca e do microfone retrô no peito, um manipulador de audiências a serviço de quem está no poder. Só não foi assim com o PT.
A concessão da TVS – hoje SBT – foi dada a Silvio Santos durante o governo Figueiredo. Logo depois, o apresentador e empresário criou o programa para divulgar os feitos do governo.
A «Semana do Presidente» era uma espécie de boletim paramilitar de divulgação dos atos do governo, custeado pelo Estado.
No regime militar, foi usado como mais um recurso para estimular o ufanismo e tentar aumentar a popularidade do presidente carrancudo, que preferia o cheiro dos cavalos ao do povo. Essa lástima, inclusive, deve ser recriada no governo Bolsonaro. Imagina, então, se colocarem antes dos filmes no cinema, como faziam, junto com o Canal 100 (esse, sim, saudoso)».
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https://www.brasil247.com/pt/247/midiatech/374417/Ricardo-Miranda-Silvio-Santos-o-lambe-botas.htm